segunda-feira, 5 de março de 2012

O contrato com quantidades estimadas e o compromisso com o fornecedor

Uma situação que tem sido objeto frequente de indagações é a seguinte: a Administração contrata determinada quantidade de um objeto via licitação tradicional (portanto, não para instaurar SRP), "para adquirir ao longo de 12 meses". Ao final do contrato, as aquisições não chegam nem perto do programado. Normalmente, consta do edital e do contrato que "a Administração não está obrigada a adquirir as quantidades totais". Então, a dúvida: essa forma de proceder é lícita?

Na realidade, existem para a Administração Pública as seguintes opções, excludentes entre si:

a) REGRA: quando o objeto for perfeitamente definível, deverá licitá-lo do modo tradicional, descrevendo-o de forma fechada, por assim dizer, no edital;
b) EXCEÇÃO: quando o objeto não puder ser definido desde logo perfeitamente, em razão de peculiaridades do consumo, poderá:
b.1) Realizar uma licitação tradicional, com objeto estimado, podendo variar para mais ou para menos;
b.2) Realizar uma licitação para implantar o sistema de registro de preços, opção que a lei coloca como prioritária para as compras, mas que também tem se aplicado para serviços.

Em qualquer das hipóteses da letra "b" (ressaltando que a primeira delas tornou-se bastante incomum diante do SRP), não há o compromisso com a quantidade total, o que não significa que a Administração está desobrigada de ser diligente e eficiente quando faz a estimativa. Assim, se verificado que o consumo é muito inferior à estimativa licitada, deve ser feita uma supressão, unilateralmente, no limite de 25% sobre o valor inicial atualizado do contrato, ou consensualmente, até onde o contratado concordar (art. 65, §§1º e 2º da Lei 8.666). No caso da supressão unilateral, ou seja, no interesse exclusivo da Administração, a Lei assegura o reequilíbrio econômico-financeiro ao contratado (art. 58, §2º).

Então, em suma, a cláusula do edital não é, propriamente, ilícita, mas a conduta da Administração pode ser contestada. Admite-se apenas uma variação de quantidades que decorra das indefinições normais do consumo e não que acuse erro ou falta de estimativa.

3 comentários:

  1. Cara Gabriela,

    Não concordo que, referente a quantidade estimada, haja previsão legal para "variar para mais ou para menos".

    Não poderia variar para MENOS, pela simples razão exposta no art.7o., § 4o: "é vedada, ainda, a inclusão, no objeto da licitação, de fornecimento de materiais e serviços sem previsão de quantidades ou cujos quantitativos não correspondam às previsões reais do projeto básico ou executivo.". Se assim não fosse, não haveria previsão legal para redução unilateral dos 25% e, via consenso, para mais.

    A Administração que, por exemplo, dispõe no edital comprar 1.000, mas ao final só concretiza a compra de 100, ipso facto, gera prejuízo ao licitante e está sujeita à responsabilidade civil. Exceto, se promover o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato.

    Noutro extremo, não pode consumir a mais, pois i) viola o princípio da isonomia, afinal, outros licitantes poderiam estar interessados pela maior quantidade consumida e ii) não observa o limite orçamentário e seu planejamento, logo, ferindo a LRF.

    Considerando que se trata de um breve comentário, é isto que tenho a acrescentar, contudo, o tese desafia um paper para melhor argumentação didática.

    Atenciosamente,
    Gustavo Pamplona

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  2. Caro Gustavo, obrigada pelo seu comentário!

    Na realidade, a idéia de possibilitar à Administração a licitação de quantidades estimadas e a possibilidade de o contrato também ser nesses termos está vinculada a situações de impossibilidade de estimativa total do objeto, como, p. ex., a contratação de serviços de manutenção corretiva com reposição de peças. Atualmente, esse tipo de objeto costuma ser contratado via SRP, por isso a dificuldade de se vislumbrar a hipótese que mencionei. Contudo, e penso que vc irá concordar com essa afirmativa, o SRP é um instituto que apenas há poucos anos vem sendo utilizado mais amplamente, muito embora haja o comando legal para sua utilização "sempre que possível". Antes, as licitações eram realizadas daquele outro modo (e nos municípios menores, creio que ainda seja assim, corrija-me se estiver errada), sem qualquer questionamento quanto à legalidade, desde que restasse clara no edital e no contrato a possibilidade de variação "para mais ou para menos" e se tratasse, repito, dessas situações excepcionais.

    O que acredito seja fundamental frisar é que, em qualquer caso, inclusive no SRP, a Administração não está desobrigada de planejar e estimar bem suas contratações, cabendo apuração de responsabilidades em caso de má atuação nessa fase tão relevante do processo.

    Abs,
    Gabriela

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