terça-feira, 30 de abril de 2013

O novo SRP federal (Parte final): acréscimos, prorrogações e outros

4 A disciplina sobre acréscimos e prorrogações da ata e do contrato
O Decreto nº 3.931/01 permitia prorrogação do prazo da ata para além dos 12 meses iniciais, criando uma analogia com a norma do art. 57, §4º da Lei nº 8.666, que disciplina a prorrogação excepcional dos contratos administrativos. A regra era claramente ilegal, já que Lei nº 8.666/93 de licitações, na condição de norma geral, limita a duração total do SRP ao prazo de 12 meses. O Decreto atual, corrigindo a impropriedade, admite a prorrogação da ata apenas dentro desse lapso, o que se aplicará para hipóteses em que o documento tiver eventual duração inferior. Cabe notar que o Decreto explicitou a diferença normativa entre vigência da ata e vigência dos contratos, esclarecendo que esta última permanecerá regida pelo art. 57 da Lei nº 8.666/93 e ressaltando que, independentemente da sua provável duração, os contratos apenas poderão ser assinados durante a vigência da ata.
Em relação à alteração do conteúdo da ata, o §1º do art. 12 traz vedação expressa para os acréscimos quantitativos. Contudo, a redação não é de boa técnica, valendo a transcrição:
“§ 1º É vedado efetuar acréscimos nos quantitativos fixados pela ata de registro de preços, inclusive o acréscimo de que trata o §1º do art. 65 da Lei nº 8.666, de 1993.”
Ao vedar “inclusive o acréscimo de que trata o §1º do art. 65 da Lei nº 8.666, de 1993” refere-se a um dispositivo que regula as modificações nos contratos administrativos, o que abre espaço para dúvida quanto à intenção de regular as modificações na ata ou nos contratos. Duas podem ser as interpretações:
a)      O §1º do art. 12 refere-se estritamente aos acréscimos de quantidades na ata do SRP, enfatizando essa impossibilidade com a menção, a título elucidativo, do §1º do art. 65 da Lei nº 8.666/93;
b)      O §1º do art. 12 refere-se aos acréscimos dos quantitativos previstos em ata e, também, aos acréscimos previstos no §1º do art. 65 da Lei nº 8.666/93 nos contratos decorrentes do SRP.
Na sequência, o §3º do mesmo art. 12 estabelece que “os contratos decorrentes de Sistema de Registro de Preços poderão ser alterados, observado o disposto no art. 65 da Lei nº 8.666, de 1993”.
Adotando-se o primeiro entendimento, teremos:
a.1) A ata não poderá sofrer acréscimos de quantidades em relação ao que foi previsto no edital; não há disciplina sobre outras espécies de modificações, a exemplo das demais hipóteses previstas no art. 65 da Lei nº 8.666/93;
a.2) Os contratos decorrentes de SRP não sofrem incidência do Decreto, permanecendo regulados exclusivamente pelo art. 65 da Lei nº 8.666/93.
De outro lado, adotando-se o segundo entendimento teremos:
b.1) A ata não poderá sofrer acréscimos de quantidades em relação ao que foi previsto no edital; não há disciplina sobre outras espécies de modificações, a exemplo das demais hipóteses previstas no art. 65 da Lei nº 8.666/93;
b.2) Os contratos administrativos decorrentes de SRP podem ser alterados nos termos do art. 65, §1º da Lei nº 8.666/93, com exceção dos acréscimos quantitativos.
A rigor, qualquer que seja a linha de pensamento adotada, nenhuma delas é suficiente para disciplinar a questão – embora sejam as únicas passíveis de serem extraídas do texto do Decreto. Em nosso ver, devem ser aplicadas as seguintes regras, que não são, absolutamente, novidades decorrentes do novo regramento:
a)      A ata não pode sofrer alteração no tocante ao seu objeto e às condições de execução pré-definidas (exceto preço, que pode ser revisado), pena de afrontar a natureza do SRP, cujo objetivo, num enfoque macro, é atribuir eficiência às contratações públicas e, micro, registrar o melhor preço para um objeto com determinadas características pré-definidas. A superveniente necessidade de modificações enseja a revogação do registro.
b)      Os contratos:
a.       Não podem sofrer acréscimos quantitativos, pena de burla aos objetivos do SRP, o qual, estando vigente, demanda o esgotamento dos quantitativos nele previstos;
b.      Há possibilidade de acréscimos no caso do último contrato decorrente do SRP, quando já não mais subsiste a possibilidade de sua utilização;
c.       Não podem, como regra, sofrer alterações qualitativas que não sejam decorrentes de fatos supervenientes, devidamente comprovados, pena de caracterizar burla ao sistema e afronta ao dever de licitar.
Portanto, e qualquer que seja a linha de entendimento adotada, apesar da nova disciplina contida no Decreto nº 7.892/2013, não estarão afastadas as discussões relativamente às modificações na ata e nos contratos decorrentes do SRP.
6 A questão da competência apara aplicar sanções
As normas do novo Decreto apenas ratificam a anterior compreensão de que aos contratantes – participantes ou “caronas” – compete aplicar sanções decorrentes da mora contratual ou de descumprimento total ou parcial do ajuste, cabendo ao órgão gerenciador sancionar atos ilícitos praticados na licitação, em virtude dela ou das contratações decorrentes do SRP.
7 As regras “extintas”
As últimas considerações referem-se às regras que deixaram de integrar o texto legal, especialmente as relacionadas a procedimentos e competências do órgão gerenciador e dos participantes.
A norma anterior trazia como competência do órgão gerenciador a prática dos seguintes atos, encontrando-se grifadas as partes que foram suprimidas do texto atual:
III - promover todos os atos necessários à instrução processual para a realização do procedimento licitatório pertinente, inclusive a documentação das justificativas nos casos em que a restrição à competição for admissível pela lei;
VI - realizar todo o procedimento licitatório, bem como os atos dele decorrentes, tais como a assinatura da Ata e o encaminhamento de sua cópia aos demais órgãos participantes;
VII - gerenciar a Ata de Registro de Preços, providenciando a indicação, sempre que solicitado, dos fornecedores, para atendimento às necessidades da Administração, obedecendo a ordem de classificação e os quantitativos de contratação definidos pelos participantes da Ata;
IX - realizar, quando necessário, prévia reunião com licitantes, visando informá-los das peculiaridades do SRP e coordenar, com os órgãos participantes, a qualificação mínima dos respectivos gestores indicados.
Como competências de cada órgão participante, ausentes no novo Decreto, encontravam-se:
Art. 3º ...
§ 4º Cabe ao órgão participante indicar o gestor do contrato, ao qual, além das atribuições previstas
I - promover consulta prévia junto ao órgão gerenciador, quando da necessidade de contratação, a fim de obter a indicação do fornecedor, os respectivos quantitativos e os valores a serem praticados, encaminhando, posteriormente, as informações sobre a contratação efetivamente realizada;
II - assegurar-se, quando do uso da Ata de Registro de Preços, que a contratação a ser procedida atenda aos seus interesses, sobretudo quanto aos valores praticados, informando ao órgão gerenciador eventual desvantagem, quanto à sua utilização;
III - zelar, após receber a indicação do fornecedor, pelos demais atos relativos ao cumprimento, pelo mesmo, das obrigações contratualmente assumidas, e também, em coordenação com o órgão gerenciador, pela aplicação de eventuais penalidades decorrentes do descumprimento de cláusulas contratuais; e
IV - informar ao órgão gerenciador, quando de sua ocorrência, a recusa do fornecedor em atender às condições estabelecidas em edital, firmadas na Ata de Registro de Preços, as divergências relativas à entrega, as características e origem dos bens licitados e a recusa do mesmo em assinar contrato para fornecimento ou prestação de serviços.
Não se pode pressupor que a supressão textual de tais regras tenha afastado o dever implícito de segui-las. Nesse primeiro momento, há que se ter cautela e identificar aquelas que, a despeito da ausência de explicitação na ordem jurídica, mantem-se exigíveis, seja por se relacionarem a questões operacionais que não sofreram modificações, seja por respeitarem a deveres inerentes à boa atuação administrativa.
Conclusões
O Sistema de Registro de Preços é uma ferramenta indispensável à atuação eficiente da Administração Pública. Apesar das críticas possíveis, algumas delas tecidas acima, o Decreto nº 7.892/2012 deverá melhorar sua utilização, além de resgatar o devido respeito pelo instituto, maculado pelos efeitos negativos gerados pela anterior regulamentação da prática da “carona”, inadequada. Ademais, não se pode deixar que a criatura se sobreponha ao criador e que suas falhas atinjam todo o sistema. Em outras palavras, não se deve esquecer que, apesar de sua importância, a possibilidade de adesão é apenas um dos aspectos do SRP, não o próprio SRP. A boa utilização do SRP – inclusive no que tange à “carona”, que parece já estar consolidada a despeito da crítica de inconstitucionalidade - poderá e deverá trazer inúmeros benefícios, sendo necessária prudência e bom senso na observância das regras e princípios constitucionais e legais que orientam a atuação administrativa.
 

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